Sem o formalismo de um espaço destinado oficialmente para a arte, onde o público já espera receber alguma dose de cultura, ônibus urbanos de Curitiba estão se transformando em palcos para disseminação da literatura. Até 1° de dezembro, passageiros de diversas linhas serão surpreendidos por mediadores que fazem leituras de poemas nos ônibus, quebrando a rotina e aproximando a poesia da matéria que a faz existir: a vida cotidiana.
A iniciativa faz parte do segmento de Literatura da Bienal Internacional de Curitiba. A idéia é mesmo causar impacto no público, que em geral nada espera durante uma viagem de ônibus. Até que alguém, um mediador, anônimo como qualquer outro que compartilha daquele ônibus em trajetos de rotina, quebra o silêncio e, em voz alta, sem prévio aviso, começa a ler uma frase, um verso ou uma poesia completa. Não importa se há quem preste atenção ou quais as reações, que são as mais diversas, a leitura acontece e a cultura se democratiza.
A proposta é do curador Ricardo Corona, responsável pelos trabalhos de literatura da bienal. Para nortear a ação, Corona organizou uma antologia de poemas chamada Fantasma Civil. A coletânea reúne 42 poesias de 42 escritores. Os autores selecionados são curitibanos ou têm alguma relação com a cidade, como Paulo Leminski, Helena Kolody, Marcos Prado, Zeca Correia Leite e outros.
Ausentes e Sensíveis
Ausentes e Sensíveis
Os atores Danielle Campos e Ricardo Nolasco, dois dos mediadores, realizaram uma ação conjunta na linha Centenário–Rui Barbosa, sentido bairro. Danielle se postou ao fundo. Quando o ônibus já tinha deixado o Centro e as pessoas estavam mais acomodadas, começou a ler: “(...) vou falar das impressões que uma vida deixa (...) os sonhos, esses ficam para trás ...” – trecho da poesia I’Love Raskolinikov, de Leo Glück.
Aparentemente, o público não reagia, permanecia absorto em seus pensamentos e mantinha o aspecto de ausência. Danielle continuou a narrativa. Após alguns minutos, uma senhora estalou os olhos atenta. “Achei lindo! Cada um fica envolvido com os próprios problemas. Muitas vezes, nesse minuto, a gente tá pensando em uma coisa ruim e se alegra de ouvir uma coisa bonita”, afirmou a dona de casa Luzia Ferreira, de 58 anos. Ela gosta de ler romances e contou que havia acabado de sair do hospital onde o irmão estava internado. “Por alguns minutos esqueci de mim”, confessou.
Danielle acredita que, embora o ambiente seja marcado pela rotina, ocorre uma intervenção. “No ônibus, há um universo particular e a leitura provoca essa quebra da rotina. Gera uma curiosidade de saber por que estou falando mais alto”, analisa a atriz.
"(...) é mais barato, é mais barato, 42 polegadas de urânio enriquecido. Always! Ultrafino, compacto, quente, delirante troca de tiros entre Jesus voltará na zona de convergência (...)” iniciou Ricardo Nolasco, em tom mais incisivo, a leitura da poesia O Muro, de Emerson Pereti. “Nos poemas mais violentos percebo que há um susto, começo baixo e aumento o tom da voz. É uma leitura mais performática.”
A observação do ator se confirmou na reação de Nelson Oliveira, de 50 anos, que disse ser gerente de livraria. Empolgado, Oliveira até arriscou o palpite de que a poesia seria de Mário Quintana. Ainda que a autoria seja outra, demonstrou ter apreço por poesia. “Muito bom. Gosto de livro. Acho bom levar cultura onde não tem cultura”, disse ele.
A mesma reação teve a zeladora Valdinéia da Silva, de 38 anos, que ouviu uma poesia narrada especialmente para ela. “Tem que incentivar as pessoas. A gente tem que evoluir e é preciso ensinar as pessoas a não julgar ninguém”, defendeu a zeladora sobre o trabalho realizado.
Nolasco conta que desde o início da experiência, em outubro, é comum os passageiros imaginarem que, quando se posta à frente para a leitura, vai vender ou pedir alguma coisa. Ele conclui que a ação tira a arte de um lugar fechado e a aproxima das pessoas: “O mais legal é o contato que as pessoas têm com a poesia, sem ser didático. É como a música, está no ar. A poesia está no cotidiano”. O raciocínio encontra ressonância na ideia de que a arte se completa no encontro com o observador ou espectador.
Poesia no Lago
Nolasco conta que desde o início da experiência, em outubro, é comum os passageiros imaginarem que, quando se posta à frente para a leitura, vai vender ou pedir alguma coisa. Ele conclui que a ação tira a arte de um lugar fechado e a aproxima das pessoas: “O mais legal é o contato que as pessoas têm com a poesia, sem ser didático. É como a música, está no ar. A poesia está no cotidiano”. O raciocínio encontra ressonância na ideia de que a arte se completa no encontro com o observador ou espectador.
Poesia no Lago
Neste sábado (19), às 15h, acontece a Travessia do Lago, no Passeio Público. Os interessados poderão fazer a travessia do lago ao lado de um mediador que fará a leitura de poesias que compõem a antologia.
O lançamento da antologia Fantasma Civil, que reúne as 42 poesias narradas pelos ônibus, será na segunda-feira (21), no Palacete Wolff. Junto de imagens de Curitiba, as poesias são apresentadas soltas em uma caixa e após o lançamento serão distribuídas gratuitamente nas Tubotecas.
O curador de Literatura da Bienal, Ricardo Corona, e alguns autores das poesias realizam na terça (22) um bate–papo com o público na Livraria da Vila, no Shopping Pátio Batel.
Mais informações sobre a programação de literatura e da bienal podem ser obtidas no siteWWW.bienaldecuritiba.com.br.
Fonte: Prefeitura de Curitiba
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